Ao
adentrar no teatro do Espaço Xisto Bahia, nos deparamos com diversas roupas
estendidas pelo chão. Como se elas estivessem colocadas ali para secar, as
vestes de todos os tamanhos e cores parecem pertencer a uma família, carregando
histórias e cargas afetivas. A campainha toca, o silêncio toma conta do espaço
e o espetáculo começa em um dia de casa cheia pela metade.
Como
num sonho que vai tomando cor e forma, somos invadidos por uma gama de
movimentos fortes que não podem ser vistos claramente. O som dos corpos que
batem entre si e no chão se contrasta com a melodia leve música. Com o aumento
da luz, nos damos conta de que são dois corpos masculinos em cena. Estes se
chocam, se jogam e se completam num fluxo contínuo.
Ao
longo de Umbigo, Dejalmir Melo e Jorge dos Santos mantêm uma força
magnética. Alternando entre contato corporal e performance individual, os
intérpretes passam por momentos que variam entre atração e repulsa, manipulação
ativa e passiva, apoiar e servir de apoio, criando contrastes que preenchem o
espectador com as mais diversas energias. Este jogo coreográfico perdura todo o
espetáculo, numa metáfora que, segundo o release, visa explorar as relações
humanas na contemporaneidade.
Umbigo nos convida a diversas indagações. Ao nascer,
é o cordão umbilical que nos mantém conectados à nossa progenitora. No entanto,
ao mesmo tempo em que sua queda nos proporciona certa independência, seu
rompimento nos deixa o legado da dependência. Vivemos o tempo inteiro em
relação e dependemos de outros para nossa sobrevivência. Outros que não
necessariamente são humanos…
Os
intérpretes também parecem desafiar o estereótipo do gênero masculino. Entre
toques e batidas, surgem momentos de tensão, destacados pela dilatação do
tempo, onde suas bocas e seus sexos se encontram. Que relação é essa? Casal?
Irmãos? Amigos? É realmente necessário colocá-los num modelo, numa caixinha?
Pode um homem se entregar aos seus desejos e perder sua compostura? Questões
pertinentes neste contexto histórico, onde uma bancada evangélica toma as
rédeas de um Estado Laico e uma novela é boicotada por causa da representação
de amor entre duas senhoras.
Umbigo, junto com Malemolência, encerra a Mostra Baiana de Dança Contemporânea do
VIVADANÇA. Em sua segunda edição, a Mostra dá credibilidade e comprova mais uma
vez a qualidade da produção artística baiana. Aqui, santo de casa faz milagre
e, se a casa é de ferreiro, o espeto não é só de pau.
Guilherme
Fraga
Artista
da Dança, Professor da Escola de Dança da FUNCEB e Mestrando do PPG Dança da
UFBA.
Ficha
Técnica: Umbigo
Direção
e Coreografia: Dejalmir Melo (BA)
Interpretação:
Dejalmir Melo e Jorge dos Santos
Iluminação:
Pedro Dultra Benevides
Colagem
musical, figurinos e cenografia: Dejalmir Melo
Categories: Observatório VIVADANÇATags: dejalmir melo, festival vivadança, Mostra Baiana de Dança
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